Tuesday, October 26, 2004

“Até os burros se apaixonam”

O Criador não foi complacente ao dotar o burro de carácter lento. Valeram-lhe as suas credenciais de abnegado servidor do homem para conquistar uma multidão de simpatizantes, sendo óbvio que aqueles que o veneram retiram sempre dele proveito pessoal. Digamos que já nasceram burros...
O filme em exibição “A Vida é um Milagre”, de Kusturica, é um cântico ao amor de forma indubitavelmente peculiar, pois desta vez o realizador ousou dar vida a um verdadeiro personagem na pele de um burro. Este é demasiado astuto e pertinente nas suas entradas e saídas de cena, carregando sempre o fardo, até mesmo ao final da história, de passar uma forte mensagem: Apaixonarmo-nos não é burrice nenhuma!
De facto, Kusturica imprime neste filme uma forte carga afectiva em muitos dos seus personagens que se movimentam num cenário de dolorosos conflitos, pessoais ou históricos, evidenciando assim uma premeditada tentação racional em ajuizar, inequivocamente, que há um sentimento nesta vida que compensa tudo o resto: A vontade de amar.
Para mim este é talvez, e não só por isso, o seu melhor filme até agora!
Ainda a propósito de “A Vida é um Milagre”, podem ler uma outra crónica que gostei especialmente, à excepção da visão quanto ao dito burro... Mas o seu autor já foi devidamente notificado!

Thursday, October 21, 2004

A esplanada (3)

Fotografia de Cristina Garcia- Esplanada no Alto do Parque Eduardo VII, em Lisboa, Outubro de 2004

(...) só sei que as cidades
são os túmulos mais secretos das nossas paixões (...)


João Camilo. O Desejo, A Mala dos Marx Brothers

Thursday, October 14, 2004

A esplanada (2)

As marcas fotográficas...




FOTOGRAFIAS DE CRISTINA GARCIA


Tuesday, October 12, 2004

A esplanada (1)

Como qualquer citadina inveterada possuo alguns vícios geneticamente urbanos. O mais público deles todos é a minha dependência de certas esplanadas. A dose é injectada semanalmente, com prescrição para aplicar ao fim de semana.
Este sábado tomei uma “overdose”. Cheguei ao jardim Amália (no topo do Parque Eduardo VII) a meio da tarde. Quando finalmente entrei na parte coberta da esplanada, já a divina chuva abençoara o meu corpo o quanto baste para ser feliz. Mas ainda o prazer ia no início...
Aliviado o mau tempo, a minha objectiva mostrou-se interessada em namoriscar um pato(a sério!) que majestosamente se exibia no lago em frente, agora mais cheio do que nunca. E aí é que foi o bonito! A dita objectiva não resistiu a estender-se no chão para apanhar...o melhor plano do pato. Em contrapartida, o pato submergiu vezes sem conta para testar a paciência da pretendente e dar um ar de vedeta. Enfim, como sedução que se preze, exigiu muita cumplicidade dos dois mas no final da tarde o enlace deu-se!
Destes momentos inéditos ficaram marcas fotográficas a ver brevemente num “post” perto de si...
Moral da história: Mais vale um pato no lago que dois a voar!

Saturday, October 09, 2004

Rua da Voz do Operário

Fotografia de Cristina Garcia

Se o chão
virasse céu.
E o céu
ficasse do lado do chão,
sentíamos todos esta sensação.

(C.G.)

Thursday, October 07, 2004

Um "filme" que não é ficção!

Aviso prévio: Este post não deve ser lido por mulheres em idade adulta que não saibam lidar com a vida tal como ela é (pura cautela...).
Há algumas mulheres que produzem e realizam verdadeiros “thrillers” em que procuram desvendar o mistério de uma outra personagem. O “filme” tem sempre dois actores principais que partilham há bastante tempo laços afectivos fortes e decorre num ambiente familiar.
A história do “filme” caseiro começa quase sempre com um episódio desconcertante na vida do casal: Um dia a viagem de férias antecipadamente planeada ao pormenor fica adiada porque o marido é confrontado com uma inesperada deslocação de trabalho ao estrangeiro. As dúvidas fermentadas durante algum tempo com a chegada tardia a casa do marido consomem-se, a partir daí, num “filme” em que a terceira personagem é uma outra mulher. E é nessa parte que nós as mulheres ( só algumas, diga-se) somos as melhores realizadoras daquela ficção. A câmara oculta dá vida a uma terceira personagem jovem deslumbrante, possuidora de uma técnica infalível de sedução que leva qualquer espécie masculina a “pecar”. E a história contada é quase sempre igual. O fim da história é que nem sempre é o mesmo...
O filme “Nathalie”, com realização de Anne Fontaine, e com Fanny Ardant (com a sua amadurecida beleza), Emmanuelle Béart e Gérard Depardieu, procura desvendar o mistério.
Um filme a não perder mesmo!

Monday, October 04, 2004

Estação de Santa Apolónia


Fotografia de JOSHUA BENOLIEL- Estação de Santa Apolónia, Outubro de 1911



GUIÃO PARA SANTA APOLÓNIA


entre correntes de ar, numa estação
de caminho de ferro, parte alguém
e alguém está a chegar e tudo sem
se avistarem por entre a multidão.

fica o destino à solta, mas refém
de ironias do acaso e da emoção
e descuidos do tempo e da razão
nos trilhos apressados de ninguém
.(...)

(Vasco Graça Moura)